A continuação do poema

Texto de Rui Miguel Rocha, publicado na revista on-line «Novos Livros» (www.novoslivros.pt) em Dezembro de 2020, sobre o livro de poesia Estação, de José Carlos Barros (ed. On y va)

 

É a estação a que queremos chegar e também aquela de onde podemos partir. No caso do José Carlos Barros talvez tenha sido essa a sequência, se é que há sequência, não estou certo de que tal coisa exista. O que nos interessa é a consequência: a continuação do poema.

E se somos jovens e como Rimbaud nada nos sustém, haja quem se aguente sem fugir para a terra de ninguém. Felizmente o José Carlos Barros não fugiu, como se verá mais à frente. Entretanto, por este livro passam poemas, alguns leves como plumas, outros rápidos ou pesados como comboios. Todos para ler em voz alta e esperar pelo fim de tarde e pelos pássaros atrás dos quais o silêncio e as nuvens, o que nos impede o desgaste.

«(vês a ironia? tinta permanente)» pela nossa, eterna, mortalidade. Porque cada poema é isso mesmo: «a boca indecisa dos pássaros», «garagens de fogo».

E «um verso dura muitas vezes o instante do mistério» «como se/ de súbito o desejo fosse o ofício dos nossos corpos».

Enfim, tudo isto acaba por ser um «contrabando de luz e de mundo».

E o meu desejo passa por nunca seres apanhado.

[Texto: Rui Miguel Rocha]