O papel de cada um de nós na construção de uma sociedade mais justa

Texto de Helena André, de suporte à apresentação em Lisboa (Universidade Lusófona), a 6 de Abril de 2019, do livro O Prazer a Tansgressão, de Luís Bento (ed. On y va)

 

É com muito gosto que estou hoje aqui, agradecendo muito o convite da On y va, para fazer a apresentação do Livro O Prazer da Transgressão, que reúne 25 textos escritos pelo Luís Bento.

Conheci o então, para mim, Prof. Luís Bento em Fevereiro de 2006, enquanto sua aluna na pós-graduação em Ética e Responsabilidade Social, tendo-me surpreendido com a sua clarividência de análise, da qual decorria uma «ordem» em que os pensamentos fluíam de forma natural e simples, estabelecendo as pontes, temporais e referenciais, que davam sentido ao conhecimento, conhecimento esse construído também com as experiências e vivências que partilhava com os alunos.

Concluída a pós-graduação, mantivemos o contacto, talvez porque o Luís gostasse de me «despentear», não o cabelo, que pela sua natureza já o é, mas as minhas ideias, as certezas e também as incertezas, e talvez porque eu gostasse de falar com pessoas desassombradas, sem medo das palavras; e a propósito de alguma coisa ou de coisa alguma, tomávamos café ao fim da tarde e conversávamos sobre os mais variados assuntos, acabando as nossas conversas, invariavelmente, por se encaminharem para questões associadas às transformações que ocorriam na Europa e no mundo, o seu impacto nas pessoas e a necessidade de regressar às raízes para contrariar a massificação generalizada e não se perder o sentido da individualidade.

Ler este livro transportou-me para as nossas conversas de fim de tarde. Para o apresentar, farei referência apenas a alguns dos textos, deixando aos presentes o convite para a leitura da totalidade.

Sobre o livro, no qual reconheci o Luís como narrador, começo por fazer referência ao título, O Prazer da Transgressão, de que tanto gostei, e que, como me foi dito, «era muito ele», e que eu reconheço, não numa lógica de subversão mas numa lógica de criação ao ousar questionar as normas vigentes, em que (cito) «o prazer da transgressão, como prazer único e insubstituível, contribui para o nosso equilíbrio emocional e para uma melhoria do estado geral do país, pois sem a transgressão seríamos verdadeiramente insuportáveis, irritadiços, cinzentos», «seríamos pessoas sem chama» (…) «esse prazer excita os sentidos e aumenta a criatividade».

E é na senda da criação e da reinvenção que no texto sobre a «inquietude» podemos encontrar a referência aos «cidadãos dos sentidos e da emoção», e aqui (cito) «viver com esta sensação estranha de se ser de um só lado, não se ser de lado nenhum e ser-se um pouco de todo o lado, inquieta as emoções e destroça e reconstrói, permanentemente, a relação com a terra, com as pessoas e com o mundo», relação essa que ganha vida com os «obreiros», «os que fazem obra», referidos no texto «O talento, esse desconhecido», quando (cito) «ao estar associado ao ser, o talento assume uma dimensão humana e não tecnológica, pois trata-se de um ser equilibrado que canaliza a tripla dimensão desse ser – alma, espírito e corpo –, para a permanente realização, para fazer obra, e de cada obra retira aprendizagens que refinam e redesenham esse ser».

Ser esse que, enquanto talentoso «cidadão dos sentidos e das emoções», ousa transgredir e «no seu tempo» cria obra.

E a propósito do texto «A conquista do tempo», partilho uma situação que se passou creio que em 2008, quando um dia recebi uma chamada do Luís a convidar-me para integrar um projecto da faculdade, desenvolvido em parceria com outros países europeus.

Explicou-me sumariamente o projecto e eu disse-lhe que não tinha grande disponibilidade, mas que tentaria colaborar na medida em que o meu tempo o permitisse, ao que o Luís respondeu: «Óptimo Helena, então na próxima semana é preciso ir a Tours para o quick-off do projecto e pedia-lhe que fosse com a Patrícia Oliveira.»

E assim foi… É de facto necessário (cito) «conquistarmos o tempo, acertando o nosso tempo pessoal pelo tempo do mundo», evitando desperdiçar um bem precioso e não corrermos (cito) «o sério risco de nos tornarmos definitivamente infelizes», por não vivermos o que poderíamos ter vivido, com a desculpa da falta de tempo.

Mas a verdade é que, (cito) «todos nos queixamos da falta de tempo», até porque «o tempo passa muito depressa». «Falamos do tempo com grande intimidade, como se pudéssemos agarrá-lo e até como se fosse possível influenciar a sua marcha, o seu caminho… E é porque o nosso tempo não tem tempo, que não temos tempo para nada.»

O Luís sabia que no «meu tempo» cabia a colaboração no projecto.

Termino com uma referência ao último texto do livro, «Quem sou eu? Quem quero ser?», no qual o Luís no conta a história do Américo, (cito) «um rapaz tímido, discreto, quase apagado, quase pedindo desculpa por estar ali», que se candidatou à presidência da Câmara Municipal do Paúl, em Cabo Verde, e que acabou por ganhar as eleições por ter procurado (cito) «a força escondida e a crença num futuro diferente».

Obrigada, Luís, por nos ter deixado estes textos inspiradores! São textos que nos ajudam a reflectir sobre a vida, o mundo e o papel de cada um de nós na construção de uma sociedade mais justa. Uma sociedade, também por isso, mais desenvolvida.

[Texto: Helena André]