«Um novo valor literário que agora pertence a todos nós.»

Texto de Américo Telo, lido em dois momentos na apresentação em Monchique, na Cooperativa Agrícola, a 18 de Maio de 2019, do livro O Perfume da Esteva, de Paulo Rosa (ed. On y va)

 

Boa tarde!

Com a devida autorização do presidente da Direcção da Cooperativa Agrícola de Monchique, aqui presente, e como membro dos órgãos sociais, uma vez que sou vogal do Conselho Fiscal, e como técnico assistente social que desenvolve agora a sua actividade estando aqui sediado, numa estrutura que se designa por Gabinete Técnico de Apoio à Economia Rural de Monchique, quero manifestar-vos que é com grande apreço que esta cooperativa acolhe hoje mais uma iniciativa cultural: a apresentação do primeiro livro, que se espera de muitos mais, do nosso cliente Paulo Alexandre Duarte Rosa.

Digo cliente porque ele ainda não se fez associado, se bem que o seu pai, o meu amigo José Francisco Rosa, a quem presto a minha homenagem em sua memória, fosse sócio desta cooperativa quase desde a sua fundação, mais concretamente desde Fevereiro de 1980, tendo subscrito integralmente o capital social, na altura.

Deixo portanto ao Paulo Rosa uma cópia da ficha de sócio do seu pai e entrego-lhe, desde já, uma proposta para que a preencha e ele próprio se faça também associado da Cooperativa Agrícola de Monchique, uma vez que, para além de advogado, professor e agora escritor, sei, pelo meu conhecimento pessoal, que também é agricultor. Reúne, portanto, as condições necessárias para que possa apresentar uma proposta de associado à cooperativa.

Quero realçar, em segundo lugar, que ao acolher hoje esta iniciativa, a Cooperativa Agrícola de Monchique fica também muita grata e reconhecida, mais uma vez, à editora On y va, do nosso escritor António Manuel Venda, porque esta é uma oportunidade para que a cooperativa possa cumprir também o seu papel de instituição vocacionada para o que à comunidade diz respeito, quer do ponto de vista económico, quer também a nível social e cultural. Literário, neste caso.

Faz parte dos princípios cooperativos, aprovados pela Aliança Cooperativa Internacional, o «estímulo à educação, à formação e à informação, bem como o interesse pela comunidade».

Diz este princípio, o sétimo, que as cooperativas possuem um forte apelo social e devem visar o benefício não apenas de seus donos, que são todos os cooperados, mas de todo o meio social onde estão inseridas.

Este princípio exige um forte comprometimento da cooperativa com o seu meio. E no nosso caso, para além de acolhermos este e outros eventos, quer por nossa iniciativa, quer por solicitação de outras entidades, gostaria ainda de realçar que estamos aqui numa estrutura da instituição que é o seu Centro de Formação Profissional, onde desenvolvemos e promovemos, já desde 1989, a formação técnico-profissional para a comunidade de Monchique e não só, uma vez que nos têm chegado formandos de outros concelhos, inclusive.

Quero em terceiro lugar destacar a honrosa presença nesta cooperativa do professor da Universidade do Algarve, Doutor José Carlos Vilhena Mesquita, esperando que, quiçá noutras oportunidades (pois faz parte da Faculdade de Economia desta nossa universidade), possamos equacionar futuras colaborações.

Da vasta actividade científica e académica do Prof. Vilhena Mesquita gostaria de destacar um trabalho seu, realizado em 1986, História da Imprensa do Algarve, publicada em dois volumes, que me prezo de possuir e a quem adiante pedirei o respectivo autógrafo.

A qualidade das pessoas também se mede pelas suas obras, tal como esta da história da imprensa algarvia, o que nos diz já um pouco de quem é o Prof. Vilhena Mesquita.

Uma crítica oportuna diz-nos: «Esta é uma das obras de referência no contexto da bibliografia algarvia. Todos os que a têm consultado reconhecem a sua importância e interesse, para o conhecimento da cultura e da história da região e do povo algarvio. Vê-se, ao longo dos dois volumes que comportam a obra, que o autor foi exigente, competente e perfeccionista na construção do seu trabalho, pois que percorreu as principais bibliotecas do país, com particular incidência na Biblioteca Nacional de Lisboa e na Biblioteca Pública Municipal do Porto, pesquisando os seus depósitos até à exaustão para encontrar antigos jornais do Algarve. A obra divide-se em dois volumes, percorrendo um espaço cronológico que decorre entre 1833, data do primeiro periódico editado no Algarve, e 1988, data da publicação da obra. O seu conteúdo reparte-se por todos os concelhos do Algarve, seguindo uma sequência alfabética, sendo os periódicos descritos e analisados pela mesma ordem. Mas para facilitar a sua pesquisa inseriu-se no final do volume II uma lista alfabética e cronológica de todos os títulos dos periódicos.»

Destaco que, no caso de Monchique, podemos consultar os periódicos no segundo volume, nas páginas 111 a 130, onde são referidos, por ordem cronológica, os seguintes jornais:

Campeão da Província, de que não se sabe a data e não se encontrou qualquer número, dizendo o autor: «Supõe-se que o mesmo deve ter sido fundado na última década do século passado, porém nunca se viu um único exemplar. Admito que o mesmo venha na sequência da célebre questão do Ultimatum inglês, durante a qual alguns patriotas monchiquenses se manifestaram publicamente contra a ignominiosa afronta britânica.»

O Patriota, com início em 1890.

O Monchiquense, com início em 1895 e em 1926.

A Saúde, com início em 1898.

A Mutualidade, com início em 1919.

A República Portuguesa, com início em 1923.

Jornal de Monchique, com início em 1985.

Finalmente, e antes de passar ao António Manuel Venda, que imaginei que por esta altura já me teria mandado calar por duas ou três vezes, gostaria ainda de dizer que, acima de tudo, estamos hoje nesta cooperativa a acolher e a manifestar a nossa maior consideração por mais um valor humano e literário da nossa terra que aqui veio revelar-se.

É um filho da terra de Monchique.

Terra que, para além dos seus valores, enquanto território singular no Algarve e em Portugal, justifica agora que são, essencialmente, os valores e as qualidades das suas pessoas aqueles que mais podem contribuir para o seu desenvolvimento (que passa também pelo saber, pelos conhecimentos e pela cultura).

O meu amigo Paulo Rosa, dispensa apresentações.

Até porque, sendo seu amigo, não serei a melhor pessoa para o fazer com a objectividade e o discernimento necessários.

Quero contudo referir que, para além da nossa actividade em prol de outra cooperativa, a da Rádio Fóia, de que ele é presidente da Direcção e eu seu vice-presidente, lhe reconheço qualidades de trabalho, dedicação, competência e honestidade que o fazem ser uma das pessoas da minha geração mais conceituadas da comunidade monchiqueira.

E apesar de se dizer que «O poeta é um fingidor/ Finge tão completamente/ Que chega a fingir que é dor/ A dor que deveras sente.» (Fernando Pessoa), no caso do livro que hoje aqui é apresentado não me parece que estejamos perante o sacrifício ou a dor da escrita, esta como arte, mas sim perante uma obra que foi produzida, como o autor nos revela: que é «produto de muitos anos de encantamento e de comunhão com a Natureza», transposta até nós num gesto de coragem que a todos muito nos apraz felicitar, desejando que continue a brindar-nos desta forma com os seus encantamentos.

Bem-haja!

 

(segunda intervenção, a encerrar o evento)

A encerrar esta cerimónia, gostaria de vos dizer, em primeiro lugar, do nosso contentamento em que tenham vindo hoje à cooperativa, para além de terem vindo frequentar um curso, assistir a um colóquio ou sessão de informação ou comprar um saco de ração para o cão de estimação, um saco de sementes, batatas ou um pesticida.

Este evento permitiu à cooperativa exercer a vocação das cooperativas, que é também a de estarem em sintonia com as suas comunidades.

Pessoalmente, reconheço que o meu amigo Paulo Rosa possa, por vezes, parecer uma pessoa muito racional. Contudo, pelo que no livro nos mostra, é pessoa também afável e de grande sensibilidade: podemos, por exemplo constatá-lo através da leitura do poema «A pantomina do casal», na página 26, em que eleva os valores da paternidade e da maternidade que podemos encontrar na Natureza através dos animais que, tal como os humanos, defendem instintivamente, sem regatear esforços, e colocando em risco a própria vida, os seus filhos.

Ficamos honrados também pela presença do ilustre convidado, Prof. Vilhena Mesquita, e sobretudo pelo despertar deste novo valor literário que agora pertence a todos nós.

 [Texto: Américo Telo]